Terra Prometida - Diretor de 'Gênio Indomável' reflete sobre o preço de cada um

Em uma pequena cena de Terra Prometida (Promised Land, EUA/Emirados Árabes, 2012), Steve, o personagem de Matt Damon, compra uma limonada de uma menininha que promete ser seu produto de excelente qualidade. Steve prova o suco e concorda totalmente com a vendedora. Ao pagar com uma moeda de 50 centavos e se afastar para seguir seu caminho, ele ouve a pequena negociante chamá-lo, afim de devolver o troco, 25 centavos. A princípio, Steve recusa, dizendo-lhe que fique com o troco, mas ela não aceita, alegando: "A placa diz que custa 25 centavos. Então, são 25 centavos." É como se ela dissesse: "Seja justo comigo, pague somente aquilo que você comprou. É assim que você valoriza meu trabalho". O que essa cena e, aparentemente insignificante cena está dizendo é que o valor das coisas é muito importante, mas a dignidade das pessoas é ainda mais valiosa.
Comecei este texto sobre Terra Prometida com a descrição desta cena em particular (não é spoiler, não se preocupe) porque ela representa o que mais me chamou a atenção neste filme: a dignidade não tem preço.
O filme conta a história de Steve Butler (Damon, voltando a trabalhar com Gus Van Sant desde Gênio Indomável), um executivo de uma megacorporação de gás natural, recrutado para ir até uma pequena cidade interiorana convencer os moradores, microfazendeiros em sua maioria, a assinar concessões de perfuração em suas propriedade, com o fim de extrair o valioso gás natural do xisto localizado no subsolo de toda aquela região. A promessa feita aos moradores: milhares de dólares como pagamento pela concessão, sem que eles precisem mover uma palha. Sue Thomason (Frances McDormand, vencedora do Oscar por Fargo), outra executiva, o acompanha na empreitada, que deveria durar apenas alguns dias, mas sofre um sério contratempo quando a população decide estabelecer um dia para que todos votem sobre a aprovação ou não da permanência da empresa na cidade. Os dois colegas enfrentam oposições: primeiro, a de Frank Yates (Hal Holbrook, de Na Natureza Selvagem), um acadêmico aposentado que alega sérias contrariedades ambientais na proposta da empresa e convence o resto dos moradores a aceitar a votação; depois, e mais grave, a de Dustin Noble (John Krasinski, famoso pela série The Office), um ambientalista ferrenho cujo objetivo principal é o de desacreditar cada palavra que Steve e Sue propagam pela cidade, com relatos de cidades inteiras contaminadas depois de meses de perfuração. Estou falando de animais mortos, solo esterilizado e famílias empobrecidas.
Com todos os obstáculos postos diante de si, o próprio Steve começa a questionar a legitimidade de suas ações, ao mesmo tempo em que segue sua rotina, indo de porta em porta, encontrando argumentos para que mais e mais pessoas assinem os contratos de concessão.
Matt Damon em 'Terra Prometida'
A câmera de Van Sant enaltece as belas paisagens mostradas, mas não se trata de um mero cartão postal. Além disso, o cineasta quer mostrar aquilo que pode ser perdido se a ganância das corporações continuar sendo mais forte que o valor que cada indivíduo possui em si. O roteiro, escrito por Matt Damon e John Krasinski (que também produzem o filme), passa uma mensagem, mas está longe de ser uma peça publicitária ambientalista, a ponto de desenvolver os personagens de maneira a fazer com que nos importemos com eles, principalmente a ponto de fazer com que acreditemos nas mudanças de mente experimentadas pelo protagonista.
Uma curiosidade: Terra Prometida deveria ser a estreia de Matt Damon como diretor, mas problemas de agenda o impediram. Isso explica a entrega e confiança que o astro exibe em cada fotograma. Seu Steve Butler não é um louco ambicioso, com a visão do sucesso a qualquer preço - como, aliás, seria o estereótipo desse tipo de personagem. Sua atuação é serena, e enigmática. Isso porque até o momento do clímax, quando há uma pequena, porém decisiva surpresa, a gente ainda desconfia se a mudança no personagem realmente aconteceu ou estamos apenas sendo iludidos.
Mesmo sem ser um panfleto, Terra Prometida suscita a reflexão séria e racional sobre o futuro. Não o futuro do planeta, pois pensar assim parece grande demais para nós, as pessoas comuns. O futuro das cidades, das paisagens. O futuro do ser humano.

Promised Land (2012) on IMDb

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